Notícias e Artigos

Danos reputacionais (02.12.2021)

Vocês já devem ter presenciado alguém em público fazer acusações graves a outras pessoas ou empresas sem saber se aquilo realmente é verdade.

Isso é muito comum hoje em dia na era da fake news, mas é uma situação que sempre existiu.

O dano reputacional é uma espécie de dano extrapatrimonial, que atinge a reputação e a imagem de pessoas naturais ou jurídicas, principalmente quando um sujeito difama, calunia ou exterioriza informações inverídicas acerca de uma empresa ou pessoa física.

O direito tutela essa situação a partir da responsabilização criminal e civil do agente (cabe dizer que as responsabilidades são independentes, mas a criminal pode ter influência na civil).

Vejamos o que o Código Civil diz a respeito:

Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.

Isto quer dizer que se a materialidade do fato e a autoria forem comprovadas na esfera criminal, haverá o preenchimento de quase todos os requisitos para imputação da responsabilidade na esfera cível.

Quanto ao Código Penal, seguem as disposições que tratam do tema da calúnia e difamação:

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

  • 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

Acontece que os danos reputacionais também surgem quando uma empresa, por exemplo, se envolve em um crime de corrupção. Nesse sentido, a fim de evitar prejuízos reputacionais, ela passa a investir em uma série de ações para minimizar os danos à sua imagem. Isso pode ser feito, contudo, de maneira prévia a partir de um detalhado programa de compliance.

Segundo Danilo Brum de Magalhães Júnior,

As sociedades que empregam programas de compliance buscam estabelecer melhor segurança na condução dos negócios, na proteção dos interesses dos clientes e na preservação da reputação institucional. Tais atitudes procuram reduzir ou eliminar o risco de possíveis impactos causados pelas inconformidades nos processos (CANDELORO, et al., 2012. p. 30).”[1]

Portanto, a gestão do risco de danos reputacionais pode ser feita de maneira preventiva, seja por meio de um programa de compliance ou outras condutas pontuais, sempre tendo o objetivo de resguardar a imagem da corporação.

 

[1] MAGALHÃES JR., Danilo Brum de. GERENCIAMENTO DE RISCO, COMPLIANCE E GERAÇÃO DE VALOR: OS COMPLIANCE PROGRAMS COMO FERRAMENTA PARA MITIGAÇÃO DE RISCOS REPUTACIONAIS NAS EMPRESAS. In: Revista dos Tribunais | vol. 997/2018 | p. 575 - 594 | Nov / 2018.

Planejamento sucessório e diretiva antecipada de vontade (23.11.2021)

É natural o homem tentar prever o futuro e se planejar para a posteridade. O direito, enquanto regulador e fonte da autonomia privada, vem a socorro do cidadão para trazer maior segurança jurídica aos atos de vontade que visam regular fatos supervenientes. Assim, a partir da sua liberdade, a pessoa pode estabelecer normas privadas para reger o que acontecerá no futuro em relação a si mesma e a seu patrimônio.

Por isso, tem crescido o número de pessoas que recorrem aos advogados e demais profissionais do direito para fazer (i) um testamento, (ii) um planejamento sucessório ou (iii) até mesmo a incipiente diretiva antecipada de vontade.

Os dois primeiros instrumentos jurídicos referem-se ao patrimônio e são usados para facilitar e escolher como se dará a sucessão dos bens do interessado para seus herdeiros ou testamentários.

O testamento é o instrumento jurídico onde o testador dispõe por escrito quem será o beneficiário da parte disponível de seu patrimônio. Lembre-se que se houver herdeiro necessário, somente 50% do patrimônio pode ser objeto de testamento. O testamento pode ser público, lavrado em Tabelionato de Notas ou particular na presença de três testemunhas. Nele pode haver disposições patrimoniais e extrapatrimoniais, como por exemplo o reconhecimento de filhos.

Por sua vez, o planejamento sucessório é um conceito mais amplo, que pode envolver desde o testamento em si, a constituição de uma empresa ou holding familiar ou até mesmo o chamado trust, que só tem regulação ainda no exterior, mas há projeto de lei que pretende incluí-lo no Brasil. O trust se trata de um instrumento de planejamento patrimonial, em que o proprietário (setlor) do bem transfere sua titularidade a um gestor profissional (trustee), que passa a gerir este patrimônio, cujos frutos e rendimentos se destinam a um beneficiário. Muito utilizado por pais que tem filhos menores ou incapazes. Ou até mesmo por pessoas que gostariam de organizar a distribuição dos rendimentos de determinados bens após a sua morte. O objetivo é tornar a sucessão mais célere e menos dispendiosa, sem ter que passar pelo penoso processo de inventário, custas judiciais, honorários mais altos de advogado e imposto, considerando que o ITCMD é de 4% e há projetos de lei para aumentar sua alíquota.

A constituição de empresas familiares e o trust devem respeitar a legítima (sempre deixar 50% do patrimônio disponível), sob pena de prejudicar os herdeiros necessários e configurar a chamada fraude sucessória.

Quanto à terceira figura, diz respeito à saúde e autodeterminação do próprio estipulante. Trata-se, na verdade, de um documento em que o cidadão escolhe a quais tratamentos ou procedimentos médicos se submeterá em caso de incapacidade ou perda de consciência provocada por acidente ou doença. Daí o nome diretiva antecipada de vontade. Seu uso ainda é incipiente mas tem crescido a procura para elaboração desse instrumento, principalmente em razão da pandemia.

Enfim, estes são os documentos que as pessoas mais precavidas planejam com o avançar da idade e que gostariam de regular para um momento futuro incerto ou até mesmo para depois de sua morte.

Contrate um advogado para te assessorar e elaborar tais documentos.

 

sugestão de vídeo para entender melhor o trust: Trust: tudo o que você precisa saber - YouTube

Ferramentas para negociação (03.11.2021)

Aqui no Brasil, a procura de solução de litígios através da negociação ou da conciliação tem crescido e o próprio ordenamento jurídico incentiva tais práticas. Trata-se de uma visão mais preventiva e propositiva da advocacia, e, consequentemente, menos reativa e contenciosa.

Nos EUA, a Universidade de Harvard tem um conceito de negociação, baseada no livro “Getting to yes”, dos autores Roger Fisher e William Ury, onde os autores desenvolvem técnicas para “ganhar um sim” na conclusão de um negócio.

Em contraponto a esse livro, o Professor da Universidade da Pensilvânia (Wharton Business School), Stuart Diamond, escreveu um livro - muito lido no ambiente de negócios - chamado “Getting More – How you can negotiate to succeed in work and life, onde expande a visão da negociação com objetivo de "ganhar mais" e não simplesmente "ganhar um sim" da contraparte.

O fato é que as técnicas de negociação explicadas por este último podem ser aplicadas em diferentes contextos regionais, profissionais, pessoais e familiares. Em razão disso, é útil que nós brasileiros as conheçamos.

Basicamente, o autor nos ensina algumas ferramentas para se sair bem na negociação e aumentar o valor direta ou indiretamente da operação/transação/acordo. Ou seja, extrair o melhor proveito ou custo benefício de cada situação negocial.

Primeiramente, é preciso entender que algumas técnicas estão baseadas em psicologia comportamental. Dessa forma, deve-se ter em mente que por trás de todo negócio ou processo de acordo existe um ser humano, com desejos, experiências, traumas, medos etc.

E o conhecimento da pessoa obviamente nos traz elementos mais assertivos para desenvolver uma tratativa negocial mais humana, mais ética, considerando as emoções em jogo. Ou seja, antes de tudo, é necessário fazer uma conexão com a contraparte, entender quem ela é, como ela se comporta, o que ela quer (quais são suas demandas), qual é a forma como ela lida com a pressão, se é uma pessoa mais flexível ou rígida, dentre outras informações necessárias. Isso não significa ser manipulativo, mas tentar entender como as pessoas pensam e agem, para que esses elementos sejam usados de forma transparente e que se destinam a alcançar um objetivo.

Mas é igualmente necessário conhecer a si próprio. Saber como reagimos, se somos mais ou menos emocionais, o que desejamos, o que planejamos e, sobretudo, saber quando recuar, parar ou avançar.

Além disso, é importante identificar quem são as “pessoas chave” de determinada operação. Isso porque não adianta nada ficar tentando convencer uma pessoa que não tem o poder ou a decisão final de fechar um negócio.

O autor nos ensina, ademais, que, em algumas e determinadas ocasiões, a parte contrária valoriza mais uma determinada atitude/comportamento/reconhecimento do que o dinheiro ou o lucro em si. Dessa forma, é crucial fazer concessões emocionais, subjetivas, onde a pessoa se sinta valorizada. Essa ferramenta se aplica bastante em disputas familiares, onde, por exemplo, um casal precisa de mudanças de comportamento para continuar em uma relação sadia.

Todas essas ferramentas e mais outras que o autor esmiuça no livro devem ser utilizadas caso a caso e dentro de um objetivo claro e específico, de modo a fechar negócios ou acordos que agregam mais valor. Muitas vezes, não se busca o “sim” da outra parte, mas uma solução alternativa e até mesmo criativa, que gere bens de valor maior ou até mesmo de valor inestimável.

Dentro do processo de negociação, deve haver (i) uma comunicação clara e objetiva; e (ii) o estabelecimento de cronograma ou um plano a ser cumprido por etapas. Esse planejamento racionalizado permite que as partes se comprometam a cumprir prazos, estipular demandas, concretizar metas, para que, aos poucos, consigam "costurar" um acordo detalhado ou atingir um objetivo específico.

O mais interessante é que o autor vai explicando cada uma dessas ferramentas sob o ponto de vista prático, ilustrando os conceitos com exemplos reais que ele presenciou ou que seus alunos e clientes experimentaram e lhe contaram depois.

A negociação é muito bem-vinda no âmbito jurídico e traz inúmeros benefícios: otimiza o tempo do trabalho, as partes ganham autonomia, prestigia soluções consensuais, propõe acordos criativos, gera menos estresse e angústia nos envolvidos. Ela tem aplicabilidade no ambiente empresarial e no ambiente pessoal-familiar.

Ainda temos uma visão incipiente da negociação aplicada ao direito. Os advogados brasileiros são altamente litigiosos e desaguam demandas no Poder Judiciário, que não consegue dar uma resposta eficiente ao conflito de interesses e num tempo adequado.

Portanto, a difusão de conhecimento e informação a respeito das técnicas de negociação são extremamente salutares para o Brasil e pode ser uma possível solução para os conflitos de interesse, fazendo com que se desafogue o Poder Judiciário.

 

Vale a pena ler o livro e conferir!

 

Bibliografia

DIAMOND, Stuart. Getting more. How to be more persuasive in work and life. Currency. New York, 2010.

Vícios ocultos da construção (17.11.2021)

Contratar uma grande obra é uma das maiores preocupações de muitas empresas e pessoas físicas.

Nem todos sabem o esforço e planejamento para concretizar uma empreitada, até mesmo a escolha do construtor ou da empresa de construção (denominado de empreiteiro).

Daí a especial atenção que deve se dar à garantia desses contratos.

Normalmente, no início da contratação, há apenas um projeto, que é apresentado aos donos da obra através de croquis, maquetes ou até mesmo uma planta do imóvel. [1]

E até mesmo com a execução e entrega da obra, aparentemente pode tudo transparecer uma situação de normalidade.

Porém, ocorre muito, principalmente no âmbito imobiliário, os chamados vícios ocultos de construção ou vícios ocultos construtivos que surgem depois de concluída a construção ou reforma.

Nada mais são que defeitos nos materiais ou na execução da obra, que podem leva-la à ruína, desabamento ou então a uma situação de insalubridade ou inabitabilidade.

Assim, cumpre a pergunta: quem é o responsável pelos vícios que surgem após a entrega da construção?

O art. 618 do Código Civil brasileiro coloca um prazo de garantia de 05 anos para o dono da obra em relação aos defeitos ocultos que surgirem após a entrega dela. E, a partir da ciência do defeito, tem-se um prazo de 180 dias para demandar o empreiteiro.[2]

Ou seja, mesmo depois de concluída a obra, é o empreiteiro que fica responsável pelos defeitos que surgirem até cinco anos após a entrega da obra. Mas nada impede que as partes, em contrato, estabeleçam um prazo maior de garantia.

Durante esse período, o dono da obra deve demandar o empreiteiro em até 180 dias a partir da ciência do vício construtivo, podendo pedir a rescisão do contrato, a reexecução do serviço ou a construção de obra nova para reparar o defeito, sem prejuízo das perdas e danos.

Portanto, é sempre importante verificar e constatar a obra e eventuais defeitos, mesmo depois de concluída a construção.

 

[1] As informações técnicas e comerciais apresentadas ao dono da obra devem ser precisas e indicativas tanto das medições quanto da qualidade do empreendimento.

[2] Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.

 

Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao aparecimento do vício ou defeito.

Indenização pela perda do tempo (26.10.2021)

O que você faz com seu tempo? Cronometra cada minuto ou simplesmente deixa ele passar sem se dar conta de que é importante? Na vida corrida, não paramos para pensar sobre o tempo, mas sim quais as preocupações que com ele surgem.

Em sua significação dicionária, o tempo é a duração relativa das coisas que cria o ser humano a ideia de presente, passado e futuro; período contínuo no qual os eventos se sucedem; ou o determinado período considerado aos acontecimentos nele ocorridos.[1]

Desde físicos até psicólogos, entre outros cientistas, tentam desvendar qual seria a sua essência: se é ilusão ou algo factível, dentre esses maiores expoentes está o conhecido Stephen Hawking que criou sua teoria própria sobre o tempo.

Mas também não sabemos se o tempo é um conceito dado por um ser que não está no mesmo nível que nós. É por isso que o tempo também é explicado pela teologia ou ciências da religião, sendo forte sua presença na Bíblia.

Em Eclesiastes, o Rei Salomão conta uma série de histórias pelas quais atravessou, para depois explicar que tudo que se passa nessa vida é como “correr atrás do vento”.

Veja-se:

Examinei todas as obras que se fazem debaixo do sol e cheguei à conclusão de que tudo é inútil, é como uma corrida sem fim atrás do vento![2]

Assim, nem o sábio nem o insensato serão lembrados para sempre pelas gerações futuras, ambos serão simplesmente esquecidos no tempo. Mas como pode o sábio morrer da mesma maneira que o insensato?”[3]

E o tempo é esta realidade escapante, intangível, porque quando nos damos conta, já passou. Construímos relógios precisos, ponteiros diligentes, mas pouco refletimos sobre o nosso tempo. Esse tempo onde os segundos não importam.

Pelos gregos, o tempo foi diferenciado em kairós e chronos. O primeiro significa o tempo do qual se fala aqui, onde as coisas acontecem sem datas definidas, segundo uma vontade superior ou uma vontade que amadurece no interior de cada pessoa. Já o segundo é aquele tempo cronometrado, segmentado pelos homens em anos, dias, horas, minutos, segundos e milésimos. Sobre este tempo chronos não se tem muito o que falar, pois a Matemática e a Física já o explicam.

O tempo do qual se fala não está sob o nosso controle. Muito pelo contrário: ele é um tempo indesejado, dado e indisponível. É um tempo de reação, pois não fomos nós quem o criamos. Esse tempo é extremamente irregular diante das lupas desse mundo. De altos e baixos, de trancos e solavancos, ele avança e anda em círculos não muito perfeitos. Cada pessoa tem o seu. E, na vida, ele vai ganhando forma: não pergunta se pode entrar nem se pode sair. Esse tempo não faz aniversário. É um tempo de amar, de construir, de edificar. Tempo em vão? Não, apenas um tempo incontrolável.

Recentemente, li um livro bem curto com o seguinte título “O Presente Precioso”, a obra é do autor Spencer Johnson. Conta-se a história de um menino que conhece um velho sábio. O ancião explica ao jovem garoto que há um presente muito precioso que este precisa encontrar para continuar a ser feliz. Este presente, diz o velho, não se vê em sonho, não é algo material, mas um pequeno regalo que só a própria pessoa pode dar a si mesma.

O menino, com o passar dos anos, fica intrigado e não consegue descobrir o que seria esse presente. Aos poucos, o jovem vai se encontrando com a infelicidade. Nesse caminho, ele viaja, procura novos lugares e novas pessoas, mas não encontra aquilo que o velho sábio diz existir. Ele fica frustrado. Infelizmente, o tempo passa e ele só vem a perceber o que seria esse presente depois que cresce.

E esse presente é justamente o tempo presente. Este momento atual “do aqui e do agora”. Um momento que está em nossas mãos e que devemos aproveitá-lo como uma dádiva de Deus, pois, na realidade, não existe passado ou futuro. O único tempo que de fato é real é o presente É por isso que Johann Wolfgang von Goethe diz “o presente é um Deus poderoso”.

E sendo um presente tão precioso devemos aproveitá-lo e nos socorrer à lei quando o perdemos de forma inútil.

Nesse sentido, nas cordas bambas pelas quais caminha a humanidade, podemos perguntar: o que é o tempo para o Direito? Quais as consequências que sua perda pode gerar?

Fala-se muito, hoje em dia, de “tempo perdido” ou “tempo desperdiçado”. Nada mais é que uma situação jurídica experimentada por um sujeito num dado momento de sua vida. É aquele fato jurídico que provoca um dano consubstanciado na perda de um momento. Tempo este que poderia ter sido utilizado pelo sujeito de uma forma diferente e mais proveitosa se a situação normal daquele evento tivesse durado a medida certa.

E esta perda de tempo é provocada por uma pessoa que dá causa ao evento. Essa pessoa – física ou jurídica – é aquela que provoca o dano (a perda do tempo), pelo exercício de um direito de forma abusiva ou pela prática de um ilícito civil ou penal. Assim, o sujeito acaba por prolongar uma situação que deveria ter um prazo de resolução menor.

Isso acontece naquelas situações, por exemplo, em que o consumidor fica horas e horas ao telefone para cancelar um plano de dados da internet. Além da ligação telefônica que gera um custo enorme, o consumidor perde um tempo considerável na espera do atendimento. Tempo este que poderia ter sido utilizado em outras atividades, seja de trabalho ou lazer.

A jurisprudência admite, nesse sentido, a responsabilização do fornecedor de serviço, fazendo com que daí surja uma recomposição do dano pela perda do tempo. Isto é, aos consumidores dá-se o direito de haver uma indenização paga pelo fornecedor.

“APELAÇÃO CÍVEL - DANO MORAL - RELAÇÃO DE CONSUMO - TROCA DE PRODUTO - PERDA DE TEMPO - DESVIO DE PRODUTIVIDADE - LESÃO A DIREITO DE PERSONALIDADE. Não sendo o vício do produto sanado no prazo legal pode o consumidor optar pela substituição deste por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso (inteligência do artigo 18 do CDC). Sofre lesão a direito de personalidade o consumidor submetido a verdadeira via crucis para tentar exigir do fornecedor o cumprimento de sua obrigação, consistente na entrega do bem adquirido de acordo com as especificações contratadas e em perfeitas condições de uso. A perda de tempo do consumidor antes tratada como mero aborrecimento começou a ser considerada indenizável por parte dos Tribunais de Justiça, vez que não são raros os casos em que o consumidor é tratado com extremo descaso pelo Fornecedor. A indenização por danos morais deve ser fixada com observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Nos casos de responsabilidade contratual os juros de mora incidem a partir da citação” (TJ-MG - AC: 10145120165884001 MG, Relator: Estevão Lucchesi, Data de Julgamento: 23/05/2014, Câmaras Cíveis / 14ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 30/05/2014).

O tempo, para o direito, é aquele relacionado ao cronômetro, onde os segundos importam. É o chronos. Mas, na realidade, sabemos que o tempo industrial serve mais para máquinas que para humanos, residindo aí o ponto nevrálgico da questão: como se deve dar a indenização quando cada pessoa reage diferentemente a um tempo?

O que se quer dizer é que, em um espaço de intervalo igual, pessoas podem ter desempenhos diferentes, de acordo com suas habilidades e competências. Um médico atende um paciente em 01 hora, mas a boleira de uma padaria faz o seu produto em 02 horas. No dia seguinte, o médico pode atender em 15 minutos e a boleira realizar sua tarefa em 03 horas. Como medimos esse rendimento diferenciado?

Podemos fazer uma média de rendimento ou uma conta que leve em consideração as variáveis que podem influir no desempenho de cada pessoa. Até aqui a matemática, a estatística e a administração explicam. Mas e se estamos a tratar de tempo cujos parâmetros não se medem? Como fazemos para medir o tempo que leva para um advogado consagrar-se numa banca? Ou o profissional de televisão tornar-se apresentador de um grande programa? A atleta de curta distância se tornar uma grande maratonista? Ou o cozinheiro que cobiça ter seu próprio restaurante?

Esse tempo não se conta em dias ou meses, talvez em anos, mas tudo depende de uma série de fatores: sociais, econômicos, políticos, educacionais e por aí vai. É este o desafio para os juristas, operadores e estudiosos do Direito. Uma pessoa que perdeu a vida num acidente será ressarcida de acordo com sua expectativa de vida, mas como fazemos para que a indenização seja justa e condizente como todos esses aspectos antes demonstrados?

O direito precisa assimilar o tempo kairós e estudar novas possibilidades e fatores que interferem na formação do indivíduo. Nunca teremos como saber quanto tempo levaria para grandes acontecimentos, mas podemos chegar perto de uma previsão mais estudada, elaborada e sentida por aqueles que aplicam a lei.

 

[1] Google. Dicionário. Tempo.

[2] Eclesiastes 1:14

[3] Eclesiastes 2:16

André Furtado de Oliveira

André Furtado de Oliveira Sociedade Individual de Advocacia
CNPJ 34.295.299/0001-70

Endereço para atendimentos:
Pinheiros - São Paulo - SP
(11) 3042-2792
(11) 99160-7377