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Ação de Retificação de Registro Civil: alteração de nome (17/01/2020)

Há diversos motivos para que uma pessoa queira “alterar” ou “acrescentar” um nome ao já existente. Mas nem todos são dignos de consideração pelo Estado brasileiro.

Em termos jurídicos, chamamos esse procedimento de retificação de assento ou registro civil.

Antes de mais nada, convém informar que, neste artigo, estamos tratando do nome de pessoa natural, e não de pessoas jurídicas, que tem procedimento próprio e distinto, embora seja tratado no §1.º do art. 57 da Lei 6.015/1973.

Interessante também diferenciar prenome de sobrenome. Ambos fazem parte do nome civil, mas o prenome vem antes e o sobrenome (identificação da família) vem posteriormente.

A lei brasileira prevê o princípio da imutabilidade do nome civil (prenome e sobrenome). Ou seja, em regra geral, o nome não pode ser mudado, em prestígio aos mandamentos da segurança jurídica e da legalidade.

Assim, é preciso garantir estabilidade e segurança para que as pessoas possam ser identificadas de forma precisa e segura.

Porém, em toda regra há exceção. Ou seja, a lei brasileira prevê ressalvas à imutabilidade do nome em alguns casos ou hipóteses normativas.

Vejamos, portanto, a Lei de Registros Públicos (Lei 6.015 de 1973).

A primeira exceção é prevista no caput do art. 56 da lei, onde há a possibilidade de alteração do nome no primeiro ano após 18 anos completos, desde que não haja prejuízo ao apelido de família.

Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.                   (Renumerado do art. 57, pela Lei nº 6.216, de 1975).

Em seguida, têm-se as exceções do art. 57, que tratam dos casos em que a retificação é pedida no prazo posterior ao prazo do art. 56. Vejamos:

Art. 57.  A alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei.               (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).

Nesse artigo supramencionado, há três hipóteses, mas só pode ser feita a alteração se houver judicialização com motivo suficiente e depois de ouvido o Ministério Público, no procedimento previsto pelo art. 109 da Lei 6.015/1973.

1.ª HIPÓTESE: MULHER SOLTEIRA, DESQUITADA OU VIÚVA

  • §2º A mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com homem solteiro, desquitado ou viúvo, excepcionalmente e havendo motivo ponderável, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o patronímico de seu companheiro, sem prejuízo dos apelidos próprios, de família, desde que haja impedimento legal para o casamento, decorrente do estado civil de qualquer das partes ou de ambas.

REQUISITOS: (i) Expressa concordância do companheiro; e (ii) 05 anos de convivência ou existência de filhos em comum.

2.ª HIPÓTESE: AMEAÇA DE CRIME

  • §7º Quando a alteração de nome for concedida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente de colaboração com a apuração de crime, o juiz competente determinará que haja a averbação no registro de origem de menção da existência de sentença concessiva da alteração, sem a averbação do nome alterado, que somente poderá ser procedida mediante determinação posterior, que levará em consideração a cessação da coação ou ameaça que deu causa à alteração. (Incluído pela Lei nº 9.807, de 1999)

3.ª HIPÓTESE: ENTEADO(A)

  • §8º O enteado ou a enteada, havendo motivo ponderável e na forma dos §§ 2o e 7o deste artigo, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus apelidos de família. (Incluído pela Lei nº 11.924, de 2009)

Também há a possibilidade de retificação em caso de adoção, a pedido do adotante (art. 47, § 5.º, do Estatuto da Criança e do Adolescente), bem como em caso de naturalização (art. 71, § 1.º, da Lei 13.445/2017).

Um dos casos mais interessantes seria aquele previsto no caput do art. 58 da lei, onde há a possibilidade do acréscimo ou substituição do prenome por apelidos já consagrados no círculo de convivência do interessado.

Exemplos não faltam, como o caso da apresentadora “Xuxa” e do ex-presidente “Lula”. Lembrando que não precisa ser uma pessoa pública a requisitar tal substituição ou acréscimo. Vide o dispositivo:

Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos notórios. (Redação dada pela Lei nº 9.708, de 1998)   (Vide ADIN Nº 4.275)

Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime, por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério Público.                    (Redação dada pela Lei nº 9.807, de 1999).

Fora das previsões legislativas, a jurisprudência tem admitido, como exceção, algumas possibilidades de alteração. Nesse sentido, outros exemplos de justo motivo seriam o acréscimo de sobrenome em homenagem aos ascendentes, a correção de grafia de sobrenome estrangeiro e a substituição de nomes constrangedores e vexatórios.

Para propor uma ação de retificação de registro civil, o interessado deve procurar um advogado, de preferência com atuação na área cível e que já tenha tido causa semelhante. Sempre bom instruir os clientes que é aconselhável reunir uma série de documentos (certidão de nascimento, certidões negativas de protesto, certidões negativas processuais, declarações de outras pessoas com firmas reconhecidas, entre outros).

“Para a retificação de nome, além da plena justificação do pleito, deve o requerente juntar certidões de protestos e dos distribuidores da Justiça local, a fim de demonstrar a inexistência de expediente escuso para fugir de credores” (JTJ 141/168).

O procedimento é previsto no art. 109 da Lei 6.015/1973, que preceitua:

Art. 109. Quem pretender que se restaure, supra ou retifique assentamento no Registro Civil, requererá, em petição fundamentada e instruída com documentos ou com indicação de testemunhas, que o Juiz o ordene, ouvido o órgão do Ministério Público e os interessados, no prazo de cinco dias, que correrá em cartório.                        (Renumerado do art. 110 pela Lei nº 6.216, de 1975).

  • §1° Se qualquer interessado ou o órgão do Ministério Público impugnar o pedido, o Juiz determinará a produção da prova, dentro do prazo de dez dias e ouvidos, sucessivamente, em três dias, os interessados e o órgão do Ministério Público, decidirá em cinco dias.
  • §2° Se não houver impugnação ou necessidade de mais provas, o Juiz decidirá no prazo de cinco dias.
  • §3º Da decisão do Juiz, caberá o recurso de apelação com ambos os efeitos.
  • §4º Julgado procedente o pedido, o Juiz ordenará que se expeça mandado para que seja lavrado, restaurado e retificado o assentamento, indicando, com precisão, os fatos ou circunstâncias que devam ser retificados, e em que sentido, ou os que devam ser objeto do novo assentamento.
  • §5º Se houver de ser cumprido em jurisdição diversa, o mandado será remetido, por ofício, ao Juiz sob cuja jurisdição estiver o cartório do Registro Civil e, com o seu "cumpra-se", executar-se-á.
  • §6º As retificações serão feitas à margem do registro, com as indicações necessárias, ou, quando for o caso, com a trasladação do mandado, que ficará arquivado. Se não houver espaço, far-se-á o transporte do assento, com as remissões à margem do registro original.

Por fim, um dos casos mais polêmicos e que foi levado às portas do Supremo Tribunal Federal é a mudança de nome em caso de identidade de transgênero.

A jurisprudência vacilava em afirmar que é possível a retificação de nome em caso de transexualidade, ora afirmando a necessidade de cirurgia de transgenitalização, ora afirmando sua desnecessidade.

Porém, em 2018, por meio da ADIn 4275/DF, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por maioria de votos, a desnecessidade da alteração de sexo para retificação do nome.

Confira-se ementa transcrita abaixo:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL E REGISTRAL. PESSOA TRANSGÊNERO. ALTERAÇÃO DO PRENOME E DO SEXO NO REGISTRO CIVIL. POSSIBILIDADE. DIREITO AO NOME, AO RECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE JURÍDICA, À LIBERDADE PESSOAL, À HONRA E À DIGNIDADE. INEXIGIBILIDADE DE CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO OU DA REALIZAÇÃO DE TRATAMENTOS HORMONAIS OU PATOLOGIZANTES. 1. O direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero. 2. A identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana e, como tal, cabe ao Estado apenas o papel de reconhecê-la, nunca de constituí-la. 3. A pessoa transgênero que comprove sua identidade de gênero dissonante daquela que lhe foi designada ao nascer por autoidentificação firmada em declaração escrita desta sua vontade dispõe do direito fundamental subjetivo à alteração do prenome e da classificação de gênero no registro civil pela via administrativa ou judicial, independentemente de procedimento cirúrgico e laudos de terceiros, por se tratar de tema relativo ao direito fundamental ao livre desenvolvimento da personalidade. 4. Ação direta julgada procedente. (STF, ADI 4275, rel. Min. Marco Aurélio, j. 01.03.2018).

 

Bibliografia

Lei 6.015/1973 - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6015compilada.htm

NEGRÃO, Theotonio. Código Civil e legislação civil em vigor. 50 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

André Furtado de Oliveira

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