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Contratos coligados (04/10/2019)

Atualmente, devido à complexidade dos negócios, as pessoas e, principalmente, sociedades empresárias contratam não apenas a partir de um único contrato, mas sim a partir da conjugação de vários contratos.

Os contratos coligados são expressão dessa complexidade e nada mais são que contratos que possuem uma dependência entre si, seja ela unilateral ou recíproca.

Em verdade, trata-se, na maior parte das vezes, de uma única operação econômica que se viabiliza a partir de dois ou mais tipos contratuais.

Segundo Rodrigo Xavier Leonardo, uma das principais referências sobre o assunto na doutrina nacional, cuida-se de “uma pluralidade de contratos e de relações jurídicas contratuais estruturalmente distintos, porém vinculados, ligados, que compõem uma única e mesma operação econômica, com potenciais consequências no plano da validade (mediante a eventual contágio de invalidades) e no plano da eficácia (em temas como o inadimplemento, o poder de resolução, a oposição da exceção de contrato não cumprido, a abrangência da cláusula compromissória, entre outros)”.

Como exemplo podemos citar a compra e venda de bens domésticos nos grandes magazines do Brasil. De um lado, temos um contrato de compra e venda, em que o consumidor é o adquirente do produto e a loja é a vendedora. Ocorre que nem sempre o consumidor tem dinheiro para pagar o produto à vista. Aí entra o contrato de financiamento ou empréstimo, em que uma instituição financeira paga o valor total e financia ao consumidor em parcelas mensais. Veja-se que numa mesma operação, dois contratos estão presentes: um de compra e vendo e o outro de mútuo (financiamento).

Isso também acontece em operações mais complexas, cujos arranjos se diversificam em função da criatividade das partes. Francisco Marino, em obra paradigmática sobre o tema, refere-se ao contrato de locação de posto de gasolina e distribuição de combustível. Daí surgem problemas, como por exemplo, identificar se cabe ação de despejo.

Os contratos coligados normalmente devem ser interpretados em conjunto, pois, como se disse, trata-se da mesma operação econômica. Essa coligação pode ser estabelecida pela lei ou pela vontade das partes.

Importante que se um dos contratos tiver cláusula arbitral, o outro seguirá a mesma sorte, tendo que ser discutido em alguma câmara de arbitragem.

Consequência da coligação contratual é o que os operadores do direito chamam de derrogação do tipo jurídico. Isto quer dizer que, embora dois contratos tenham tipos diferentes e sua qualificação previstas na lei, nem todas as regras seguirão cada uns dos tipos que a lei prevê. Isso porque os dois contratos coligados acabam por se transformar em um todo indivisível, impossibilitando sua classificação em uma das hipóteses normatizadas.

Os chamados contratos coligados acabam por revisitar o conceito de parte e de terceiro. Em razão de haver dois contratos com partes diferentes, essas partes acabam exercendo uma dupla função. A primeira função contratual e uma segunda função supracontratual, que diz respeito a operação econômica como um todo. Assim, passa-se cada vez mais, em determinadas circunstâncias, haver a possibilidade de uma parte exigir o cumprimento de uma obrigação de quem não integra o mesmo contrato – é a denominada ação direta.

Enfim, os contratos coligados são expressão de um novo tempo, e cabe ao advogado poder extrair do conjunto de contratos a interpretação mais consentânea à operação econômica global, e não necessariamente à interpretação dos contratos em separado.

Bibliografia

LEONARDO, Rodrigo Xavier. Os contratos coligados, os contratos conexos e as redes contratuais. In: CARVALHOSA, Modesto. Tratado de Direito Empresarial – tomo IV. São Paulo: RT, 2016. P. 459.

MARINO, Francisco Paulo de Crescenzo. Contratos coligados no direito brasileito. São Paulo: Saraiva, 2010.

André Furtado de Oliveira

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