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Contrato de atleta profissional de futebol (20.01.2021)

O lazer sempre existiu na história da humanidade. Antigamente, em Roma, as pessoas iam ao Coliseu assistir aos gladiadores, que arriscavam sua vida em meio a animais selvagens.

Hoje, são os jogadores de futebol que desempenham o papel de entretenimento, lazer e competição no mundo, embora a empreitada não os coloque em tantos riscos como no passado.

Todo estádio, assim como o Coliseu, é construído com a finalidade de colocar os jogadores no centro de atenção, no palco, cabendo aos torcedores os lugares a volta.

Mas as decisões mais importantes referentes ao futebol não costumam acontecer nos estádios, mas sim em salas fechadas, onde empresários, jogadores e clubes firmam contratos milionários.

Antes de falar sobre o contrato profissional de jogador de futebol, eu queria contar um pouco sobre a história desse esporte tão popular.

Se formos parar para pensar, o futebol é um fato novo comparado à história da humanidade.

Porém, desde os primórdios, se tem notícia de que o homem brincava com a bola.

Há registros de que na China e no Sudeste asiático, há mais de 2000 anos atrás, estão as verdadeiras origens do futebol. Os soldados do Imperador faziam esta atividade para treinar habilidades motoras com um jogo chamado “CUJU” (que significa rematar uma bola de couro). A bola era enchida em bexigas de animais e o objetivo era coloca-la no chamado “olha elegante”, uma rede esticada por dois bambus, que se localizava no centro do campo que dividia as duas equipes.

Na Itália, no século XVI, também há registro do chamado Calcio storico fiorentino que seria um esporte com algumas similaridades com o futebol atual, embora sendo muito mais violento.

E na própria Grã-Bretanha, o Rugby, criado em 1823, que é jogado com os pés e as mãos, pode ter se desenvolvido para o futebol. Há quem acredite ainda que do futebol veio o Rugby, quando um atleta da modalidade pegou a bola com a mão e saiu correndo até o gol adversário.

Mas o fato é que nenhum desses esportes alcançou a notoriedade e a fama do futebol, cujas regras foram inventadas definitivamente pelos ingleses no final do século XIX, mais precisamente em 1863.

Ou seja, de uma coisa simples, de um passatempo, de uma brincadeira, o futebol se tornou uma competição seria, com regras e prêmios, atraindo bilhões de fãs.

O que explica isso é que o futebol tem a possibilidade de contar várias histórias.

É uma narrativa que se constrói a cada jogo, a cada competição, a cada temporada.

É também a jornada de vários heróis. Por exemplo, o jogador que nasce num ambiente de incertezas e aos poucos vai superando os desafios para atingir seu objetivo.

E os personagens dessa jornada são vários: o artilheiro, o defensor, o maestro, o velocista, o showman, o capitão, o volante aguerrido e até mesmo o cara que joga de terno com classe.

Isso mexe com o imaginário das pessoas, trazendo-lhes memórias afetivas que são compartilhadas com amigos. Os sentimentos de arrepio, êxtase e choro marcam uma geração inteira de torcedores.

É como se vibrar, torcer e cantar pelo seu time e pelos jogadores fossem prolongamentos do próprio ser, uma válvula de escape de todas as emoções represadas.

Talvez seja esta a fórmula mágica: o futebol consegue sublimar valores nacionais ou bairristas de pertencimento e dialoga com os sentimentos humanos. É a vida compactada numa partida de 90 minutos.

E o futebol tornou-se ao mesmo tempo um negócio de entretenimento global, profissionalizando-se definitivamente na segunda metade do século XX, onde já vemos os chamados clubes-empresas.

A audiência que o esporte gera fez abrir os olhos de grandes marcas, de grandes redes de transmissão televisiva, investidores, etc.

Além disso, a profissionalização trouxe negócios que caminham paralelamente à competição: sites de aposta, medicina esportiva, psicólogos do esporte, profissionais de condicionamento físico, agenciadores ou empresários, advogados especialistas em direito desportivo, e por aí vai.

É evidente que todo este crescimento fez com que os protagonistas (atletas) começassem a ganhar salários astronômicos, embora a grande parte deles vivam com salários baixos.

Juridicamente, o futebol profissional se enquadra como desporto de rendimento, caracterizado pela remuneração pactuada em contrato formal de trabalho entre o atleta e a entidade de prática desportiva (art. 3.º, §1.º, I, da Lei 9.615/1998).

Dessa forma, surgiu a necessidade de pensar juridicamente na proteção dos direitos federativos e econômicos dos atletas.

A relação entre atletas e clubes ou entre atletas e empresários deve necessariamente ser estabelecida em contrato escrito.

Nesse sentido, vale fazer uma digressão de como foi a evolução desse tema aqui no Brasil.

A lei Zico foi uma das primeiras a regular o contrato de trabalho de jogador de futebol, nos arts. 22 e 23 (Lei 8.672/1993).

Posteriormente, veio a Lei Pelé (Lei 9.615/1998), que extinguiu o chamado “passe”, ao determinar que o vínculo desportivo do atleta com o clube tem natureza acessória ao respectivo vínculo trabalhista.

O passe do atleta era o vínculo que lhe dava a oportunidade de estar apto a participar de competições representando o clube. Muitos jogadores, embora tendo seu contrato de trabalho encerrado, ficavam presos ao clube e não podiam negociar com outros times nem jogar em outras equipes.

Atualmente, o contrato de atleta profissional de futebol é um contrato de trabalho com algumas especificidades.

Vamos a elas.

  1. Partes: atleta e clube
  2. Objeto: prestação de serviços, participação em treinamentos e competições
  3. Prazo: mínimo de 3 meses e máximo de 05 anos
  4. Exclusividade: o atleta só pode ter vínculo com um único clube
  5. Forma escrita (art. 3º da Lei 6354/1976 – revogada pela Lei 12.395/2011 - legislação desportiva, que também altera a Lei 9615/1998) - Salário, bônus, gratificações
  6. Cláusula obrigatória: cláusula indenizatória esportiva

Importante mencionar também que o Clube tem o poder diretivo, normativo, fiscalizatório e sancionador em relação ao atleta. Isso quer dizer que o clube dirige quais são as atividades e organiza o que propriamente os atletas vão fazer, pode também criar regras e normas internas, fiscalizar o cumprimento delas e impor sanções pelo seu descumprimento.

A relação entre clube e atleta também tem alguns direitos e deveres específicos, que estão nos art. 34 e 35 da Lei Pelé (ex: jogador deve preservar as condições físicas, participar de treinamentos, jogos). Por outro lado, é dever do clube fazer o registro do contrato na entidade de administração esportiva da modalidade.

Com base no artigo 32 da Lei Pelé, o atleta poderá se recusar a treinar e competir caso o clube que detenha seus direitos não venha a cumprir com o contrato estabelecido entre as partes (ex: salários atrasados).

Este contrato de trabalho também tem uma jornada especial (não superior a oito horas diárias ou 44 horas semanais – previsão constitucional). Como há jogo normalmente aos domingos, o repouso semanal é concedido às segundas-feiras.

Não se inclui na jornada de trabalho a concentração, que pode acontecer em período não superior a três dias. Há tempo superior se o jogo for fora da localidade. (período à disposição do clube). Entende-se que a concentração é uma forma de o atleta ter alimentação balanceada, descanso e preparação física.

Em relação às férias: os jogadores tem 30 dias assim como qualquer outro trabalhador (aqui no Brasil, especificamente no recesso entre dezembro e janeiro - entre o fim do calendário esportivo e o começo do outro).

O atleta faz jus ao depósito de 08% relativos ao FGTS (atinge gorjetas e gratificações natalinas). Mas, não tem direito o a multa de 40% na rescisão sem justa causa, porque o contrato de trabalho tem prazo determinado.

Há também a possibilidade de o clube conceder plano de saúde aos atletas e familiares beneficiários.

Hoje em dia, é muito comum também haver cláusulas de performance, vinculando prêmios e bonificações conforme o desempenho e participação do atleta nas competições.

É prudente também falar das hipóteses de suspensão (cessação temporária e total do contrato de trabalho) e interrupção (cessação temporária e parcial do contrato de trabalho) do contrato de trabalho.

A suspensão acarreta a não obrigação de pagar as verbas de natureza salarial. Ex: afastamento por doença por mais de 15 dias, licença, suspensão disciplinar, cessão-transferência temporária (obrigação do clube a que foi cedido).

Na interrupção, o clube continua obrigado a pagar e conta como tempo da jornada de trabalho. Ex: repouso semanal remunerado, férias, convocação do atleta para a seleção.

Outra questão muito crucial é a diferença entre direitos federativos, direitos econômicos, direitos trabalhistas, direitos de imagem, direitos de arena. Aparentemente pode haver alguma confusão, mas vamos explicar melhor.

Os direitos federativos são os direitos que unem o atleta ao clube para o qual vai competir, que como disse tem natureza acessória ao contrato de trabalho. É o direito federativo que permite o atleta participar das competições pelo clube ao qual é vinculado.

Direitos econômicos, por sua vez, são aqueles que o clube ou empresário detêm que estão diretamente relacionados com a questão estritamente patrimonial. São o resultado da cessão onerosa temporária ou definitiva.

Por outro lado, os direitos de imagem são decorrentes da própria personalidade do atleta. Está relacionado à sua representação. Normalmente é negociado individualmente entre atleta e clube, ou entre atleta e patrocinador. Embora sendo um direito extrapatrimonial, ele pode ser transacionado.

Por fim, o direito de arena é aquele direito coletivo da imagem da equipe quando joga uma partida. Normalmente, esse direito é vendido pelo clube para as emissoras de televisão, rádio ou internet, e repassado 5% para o sindicato dos jogadores, que, por sua vez, repassa para os atletas que participaram da partida.

 

André Furtado de Oliveira

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